sexta-feira, 31 de julho de 2009

O Sentido da Vida. O meu, pelo menos.

Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma, a vida não para...
Solte o clipe e use a canção como trilha sonora!





Uma conversa, hoje, lembrou-me a indagação, tão antiga: Qual o sentido da vida?

Uma amiga querida refletia ao telefone sobre o que fazemos de nossas vidas: Trabalhar, comprar coisas, continuar trabalhando para pagá-las e daí por diante é só apertar o "repeat". No plano de fundo da conversa, a dúvida sobre qual é a nossa missão no mundo, ou onde se encontra o verdadeiro sentido da existência. Essas coisas...

Tenho passado algumas décadas debruçado sobre a questão. Na teoria e, principalmente, na prática. Acredite: não foram poucos os ângulos pelos quais olhei para o assunto.

Mas vamos aos fatos.


Fotografei as flores aí de cima na última terça, enquanto tentava cumprir um mandado na zona rural. Bem, para quem não acompanha o noticiário, foi o dia em que choveu absurdamente em São José dos Campos. Carros amassados pelo granizo, bairros alagados... E o inteligente do oficial de justiça em uma estrada de terra! Evite comentários sobre isso, por gentileza, não aumente meu constrangimento. Comecei a ficar tenso. Depois, fiquei totalmente tenso! Aí não tinha mais o que fazer com a tensão e resolvi parar o carro, porque achei que aquelas flores tão coloridas, tão alegres, formavam um contraste lindo com o dia cinzento e ameaçador! Parar o carro naquela lama implicava em um risco de ficar atolado, mas quis fazer a foto mesmo assim e levar a imagem como o símbolo de um insight.

Acontece que uma semana antes meu celular quebrou, meu computador foi infectado por vírus que devastaram meus arquivos e me causaram um enorme prejuízo, meu filho ficou doente, perdeu sua carteira com documentos e cartões bancários, além de várias outras dificuldades em uma cascata que parecia interminável. A sensação era de que os problemas pulavam das gavetas, caíam das árvores e saíam dos bueiros para me perseguir... Um pesadelo!

Família reunida na mesa para definir a estratégia d
e sobrevivência:

_ Pai, não é melhor fazer umas orações, não?
_ Tá muito estranho isso! É muita coisa ao mesmo tempo...
_ Credo, parece filme de terror!
_ Será que foi alguma energia ruim?

Depois de algum tempo trocando impressões e piadas de humor negro, concluímos que o melhor a fazer era começar logo a reconstruir o que havia se perdido. Resistimos à tentação de culpar o sobrenatural e rogar ao céu que nos enviasse um técnico em informática e dinheiro para o prejuízo. A cada um dos filhos pedi que me ajudasse no que fosse capaz. Pedi ajuda com sinceridade, porque estava precisando muito!

Resumi nessa atitude o que penso sobre a vida: Eu não sei e talvez nunca saiba se existem mesmo coisas sobrenaturais, inteligências paralelas e não humanas. Mas nas humanas eu acredito. Acredito de verdade nos homens, nas mulheres e na sua capacidade de cooperação, para pequenos ou grandes projetos. Há uma teoria de que o homo sapiens sobreviveu ao neandertal porque, embora mais fraco, era mais cooperativo. Acredito nela e pretendo ser digno dessa herança.

Os dias seguintes foram (e ainda estão sendo) difíceis, mas me deixaram um sabor maravilhoso: Meus filhos cuidaram da casa, da comida, da roupa, levaram vários cafés para mim no quarto! Tudo para liberar meu tempo e minha energia para a solução dos problemas. Meu filho do meio passou umas cinquenta horas baixando e testando programas que recuperaram parte dos meus arquivos, o que reduziu muito meu prejuízo.

Aquela semana passou, como sempre acontece. Mas não somos mais a mesma família! Temos mais confiança uns nos outros e fortalecemos nossa crença na ajuda do companheiro ao lado. Não entramos em desespero, não gritamos nem ofendemos a quem amamos só porque os dias estavam difíceis. Pedimos e oferecemos as mãos, numa atitude tão ancestral quanto nossa espécie...

Sentido da vida, para mim, é tudo aquilo que se sente da vida. Não creio que haja um "sentido", entendido como direção, ou mesmo como motivo. A direção a gente vai criando enquanto vive; os motivos variam conforme o indivíduo e até mesmo conforme a época. Mas há muito para ser sentido, saboreado e depois recordado, que nós desperdiçamos por estarmos ansiosos em encontrar um culpado ou um salvador nos momentos de crise... Eu e meus três filhos lembraremos com orgulho de como atravessamos algumas tormentas e vamos rir em volta da fogueira, contando aos meus netos.

Quando colhi
a imagem de flores tão lindas no meio da tempestade, eram esses dias que me passavam pela memória.

E o carro não atolou, se é que você estava preocupado.


quinta-feira, 2 de julho de 2009

(Im) posturas


Trilha sonora por conta de Nina Simone: My Way.

Muitos dos caminhos por onde andei, partiram-se. Eu sei bem quantos foram! De mim não se poderá dizer que não andei, nem que não fui feliz andando. Mas vejo a terra trincada quando olho para muitas de minhas pegadas... Estar na estrada é assim mesmo e o Arnaldo Antunes sempre me lembra, em uma canção muito linda, que "...não há o que lamentar, quando chega o fim do dia...".

Tenho me esforçado para que a visão do que ruiu não me impeça de ir "tocando em frente" (sempre escorrego para essa música...). Todos os dias pressinto as possibilidades de um caminho novo, seja para um lugar, seja para um coração ou ainda para uma idéia não explorada. Mas esses caminhos não coincidem mais com a estrada para a qual fui preparado. O chão que sustenta homens e mulheres, que abrigou os meus planos concretos e os impossíveis, de repente me parece estrangeiro. Talvez tenha sido sempre assim e o que mudou foi minha capacidade de reconhecer o descompasso.

Seja como for, um palco é que sustenta agora os meus passos. Mas não sou um ator, não reconheço esse palco e sinto que cedo ou tarde perceberão a impostura. Eu percebo.

Quando vejo homens e mulheres muito, muito velhos, sinto-os como companheiros de vida e de despedida de algo que já não está mais ao alcance.
Eles ao menos usam as filas preferenciais em bancos, vantagem que me faz falta às vezes... Olho os velhinhos com uma sensação de coleguismo. Algo como "eu entendo esse seu olhar perdido no tempo; também deixei alguma coisa lá...". Mas é que acompanhei e protagonizei tantas histórias, vi tantas coisas bonitas e feias, vivi tanto e tão intensamente, que sinto como se tivesse nascido há séculos! Tudo indica que meus cabelos também têm essa sensação.

Já com as crianças, compartilho um certo estranhamento da vida social. Como elas, não entendo mesmo o porquê de tantas complicações em alguns assuntos tão simples! Por que se desperdiça tanto tempo com burocracia? Heim? Com discussões infinitas e estéreis? Com vaidades que devoram o único tempo que se poderia usar brincando, rindo, fazendo qualquer coisa que desse prazer sem impedir o prazer do outro? Disseram muitas vezes em minha infância que, quando eu crescesse, entenderia bem todas as coisas. CRIANÇAS, CUIDADO: ISSO É UMA MENTIRA! Algumas coisas a gente não entende nunca porque não fazem nenhum sentido.

Em dias como hoje, cada vez menos raros, sinto-me como na música do Belchior: Muito jovem pra morrer e velho pro rock'n roll.

Mas nem tudo são labirintos! Momentos muito felizes permanecem em janelas sobrepostas da existência, ecoando em mim para sempre. Meninos e meninas: ÂNIMO! Saibam que ganhei abraços maravilhosos, lindos sorrisos, afagos generosos de amigos de verdade! Houve quem se entregasse à minha paixão, quem risse muito das piadas bobas que contei, quem confiasse em mim para tudo na vida... Houve também quem se machucasse com o que eu disse e com o que fiz. Enfim: tenho passado pela vida vivendo e, diante dos palcos, tenho escolhido atuar, mesmo não sabendo como se faz. Analisando o, digamos, conjunto da obra, não acho que fiz certo nem errado. Apenas assumo as minhas (im) posturas.

Morreu hoje o pai de um amigo muito querido.

Li hoje um livro delicioso sobre o humor peculiar, um humor quase triste, do Mário Quintana (Ora Bolas, de Juarez Fonseca - L & PM).

Não consegui trabalhar tanto, nem tão bem como queria.

E a tarde chuvosa fez minha solidão mais nítida do que eu estava disposto a vê-la.

Mas a noite chegou, finalmente. Por hoje já posso abaixar o pano...

Amanhã tem espetáculo? Tem, sim senhor...


Nao é possível a amizade, quando dois silêncios não se combinam.
(Mário Quintana)